Dirigido por David Slade
Esse novo conceito que Black Mirror inventou só poderia ter vindo das mentes por trás dessa serie mesmo. Apesar de encontrarmos dificuldade de enxergar alguma crítica a algum tipo de tecnologia futura aqui, essa idéia fica muito mais na prática do que na teoria.
Bandersnatch é um filme à parte das temporadas de Black Mirror que foi lançado enquanto esperamos a quinta temporada. A idéia é que seja um filme interativo, onde você escolhe as opções e quais caminhos a história vai tomar. Nos pegamos investidos nesse formato desde o início. As barreiras entre filme e jogo são quase invisíveis. Toda a metalinguagem que o filme constrói na sua relação roteiro/interatividade funciona de maneira bastante inteligente inclusive. O filme constantemente vai entrando cada vez mais a fundo nessa proposta e atinge altos níveis de imersão. Em determinado momento, em uma das possibilidades, o filme passa a nos reconhecer como expectadores (e porque não, comandantes), havendo assim a quebra da quarta, ou até mesmo da quinta parede. Nos pegamos, de forma restringida, é claro, conversando com o protagonista. Essa nossa interatividade e as diversas camadas de metalinguagem na história são, sem dúvidas, os maiores acertos do filme.
Existe um tema por trás desse método de game e alguns ótimos momentos quando a questão de diversas realidades paralelas vem a tona. Quando voltamos para uma etapa anterior, os personagens mudam suas falas, como se estivessem presenciando um déjà vu. Esses detalhes que causam o sorrisinho no nosso rosto. O debate sobre livre arbítrio também é tocado diversas vezes. Os diálogos sempre nos trazem de corpo e alma para dentro daquele universinho e nos sentimos presentes o tempo todo. Passamos a questionar inclusive a nossa liberdade de escolha, ou não. Até onde nós, que comandamos essa história específica, podemos de fato escolher o que quisermos? Isso vai de encontro com conversas que os próprios personagens tem ao longo do filme. Mais meta que isso, impossível.
Infelizmente a técnica aqui não ajuda muito no aprofundamento da história em si. Todas as possibilidades são muito rasas. Apesar de pelo menos três dos "grandes" finais seguirem caminhos bastante distintos, ainda assim sentimos falta de uma maior variedade de acontecimentos. Chega um momento que nos pegamos presos num loop de pequenas interferências que não conseguem sair do chão. Pode ser meio frustrante. Me peguei viciado em descobrir todos as ramificações dessa história. Mas em determinado ponto percebi que não variavam muito e a brincadeira, que no início estava super divertida, se tornou repetitiva. Você se sente preso na limitação de possibilidades. Poderiam ter expandido muito mais. Pra que se gabar assim de "cinco horas gravadas de cenas" se quase nada muda? Mas os três finais principais são os mais legais e até que satisfazem, de uma maneira ou de outra. Um em particular é o meu preferido. O mais meta de todos!
Bandersnatch pega um conceito, o explora ao máximo, mas o conteúdo em si acaba sendo deixado de lado para por em prática uma interação com o público que se perde no caminho. Interessante até o fim, parece que os criadores se embolaram um pouco e tentaram focar mais em como desembolar tudo do que criar grandes momentos no filme (como a melhor parte que envolve uma viagem de ácido e falas extremamente bem elaboradas). Vale o tempo, mas não é um grande acontecimento como poderia ter sido.
Quanto aos famosos easter eggs de Black Mirror, continuam lá. Tá tudo interligado. Deu até saudades da serie. Que venha a quinta temporada!
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