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🇮🇹/🇺🇸 Suspiria (2018) 🌕🌕🌕🌕🌗

Foto do escritor: Bruno SantiagoBruno Santiago

Dirigido por Luca Guadagnino


Falar do novo Suspiria sem sequer mencionar o original, um clássico absoluto do cinema do horror, seria covardia, até mesmo com a nova obra de Luca Guadagnino.


Dario Argento criou um obra de arte audiovisual em 1977 que ficou marcada até hoje. Argento sempre foi, muito mais, um excelente diretor estilístico do que narrativo. O que sempre deslumbra qualquer olhar em seus filmes são tanto a direção e a fotografia inventiva como o design de produção. Suspiria seja talvez o maior marco em sua carreira focado quase que inteiramente em um estudo de cores no cinema e como isso ajuda na criação de uma bela atmosfera visual.


Guadagnino desde o início disse que seu remake seria muito mais uma homenagem ao sentimento que o original lhe causou do que seguir a risca o que foi feito antigamente. E ele acerta perfeitamente aí. Aqui não temos cores vibrantes e contrastantes. A palheta de cores é totalmente acizentada com alguns pontos de cor espalhados pelos planos. Se eu pudesse fazer uma comparação, Suspiria dos anos 70 é um filme sensorialmente visual, enquanto Suspiria de 2018 é um filme sensorialmente auditivo. O trabalho de som nessa produção é espetacular e só me fez querer assisti-lo nos cinemas. Cada detalhe, cada rúido, cada sussurro, cada barulho é milimetricamente bem pensado. O som ultrapassa as barreiras de planos e quebra totalmente esse conceito, costurando as cenas e nos trazendo profundamente para aquela escola de dança.


A câmera de Luca transborda criatividade e inspiração. Todos os movimentos elegantes. Todos os snap zooms remetendo a um estilo setentista do cinema de exploitation. Ele sabe muito bem usar o conceito de narrativa visual com harmonia na mistura de estilos.


Os sets e os figurinos são lindíssimos. Tudo em total harmonia com os anos 70. Se não tivessem rostos conhecidos na tela, o filme seria facilmente confundido com uma produção da época. Tudo muito bem apurado e produzido. A maquiagem é um show a parte. Sem nem metade da violência que o filme de Dario Argento possui, esse filme tem apenas três cenas que entregam isso, e de forma nem um pouco tímida. Luca faz questão de mostrar tudo, em closes e cenas intermináveis, que causam o proposital desconforto nos fazendo querer fechar os olhos. Argento nos brinda com uma violência caricata enquanto Guadagnino explora essa violência com muita realidade. O sexto ato, um banho de sangue e gore, foi feito sob medida para satisfazer os viciados no gênero. Sem contar o uso da cor vermelha com um filtro intenso, que é a homenagem mais escancarada ao original. Demora para entrar alguma cor forte, mas quando chega sentimos que valeu a pena.


Sinto que o filme de Dario não tem tanto apego a história (e não acho mesmo que foi intencional, o mestre realmente não tem um olhar muito apurado para isso) quanto o de Luca. Aqui, a história é apresentada sem pressa nenhuma. São 2h32 de filme. Cada personagem tem a sua devida importância com suas motivações explicadíssimas. A história é 100% revelada e todos os lados são destrinchados. Muitos consideram que o roteiro tem muita barriga. Eu realmente não acho. Já virou uma marca da filmografia de Guadagnino as longas durações de seus filmes. Ele faz questão de não deixar um ponta solta e nos mostrar tudo que é necessário sobre os personagens centrais e como eles se encontram na história.


Mas o tédio nunca aparece em Suspiria pois o clima de pesadelo é constante. Um pesadelo diferente do de Argento. O surrealismo visual dos anos 70, aqui se transforma em um dadaísmo contemporâneo. Os letterings que aparecem ao longo do filme, formando molduras, provavelmente elaboradas por artistas gráficos, são uma das cerejinhas. Luca sempre faz o dever de casa completo nesse quesito artístico. As próprias danças seguem essa vibe, no melhor estilo Sia. O roteiro também mantém muita coisa subentendida e não nos dá o final mastigadinho que pode-se esperar, caindo mais pro lado interpretativo. Um plot twist completamente inesperado deixa nossos olhos arregalados para toda a sequência final. Após essa porrada sutilmente forte que ele nos dá, precisamos de um tempinho para digerir e refletir sobre tudo que passamos. Saí querendo uma nova trilogia das Mães, agora nas mãos de Luca Guadagnino. Sou fã de carteirinha do cinema desse diretor e só quero mais e mais trabalhos dele. Sejam originais, remakes ou continuações.


A trilha sonora de Thom Yorke trouxe um estilo muito mais "cool" do que o esperado. Ela é um personagem, assim como Goblin fez em 1977, só que com abordagens completamente distintas. A música principal, presente na primeira e na última cena, é linda de arrepiar. E todos os momentos instrumentais ao longo do filme mostram que a sintonia do diretor e do compositor foi precisa. Quando as bruxas são apresentadas, logo nos primeiros 20 minutos, entra uma batida moderna e vintage ao mesmo tempo, combinada com um plano sequência que extrai o máximo das excepcionais atrizes mais velhas. O tema da dança de Suspiria transcende o roteiro, com esse balé do diretor, o compositor e as atrizes experientes. Aliás, destaque para, não só Tilda Swinton como também, Angela Winkler, a Miss Tanner. Essa mulher hipnotiza qualquer quando aparece em cena. A jovem que interpreta a bailarina Sara, Mia Goth, também está inspirada. E o sorriso no rosto com a participação da Jessica Harper (que interpreta a protagonista no Suspiria original)?


Infelizmente o filme não é perfeito por apenas um motivo, devo ser justo. Tilda Swinton. Não me levem a mal, ela é uma das melhores atrizes da atualidade e aqui não faz diferente. Sua Madame Blanc e Helena Markos são perfeitas em caixa alta, e mostram que isso sim é uma atriz que sabe se camuflar. Mas a idéia de colocá-la para interpretar o personagem do Dr. Josef Klemperer não ajudou no vínculo emocional que tenta se criar, especialmente no epílogo. Se fosse um ator de fato naquele momento, eu estaria afogado em uma poça de lágrimas. A cena é muito bem escrita. Mas o fato de saber que é a Tilda debaixo de toda aquela maquiagem, me afastou, durante todo o filme. Só consegui apreciar o quão boa ela é, sempre que o personagem aparecia, mas nunca me convenci de aquele era realmente um personagem concreto.


Praticamente perfeito, Suspira de 2018 se tornou - como esperado - um dos meus favoritos do ano. Não é um terror convencional. Não espere isso. E por mais longo que seja, é um filme que merece ser revisto. As duas horas e meia passam rápido. É pesado, carregado, cru, estiloso, criativo, focado e o melhor de tudo, indolor.


Markos!



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