Dirigido por Spike Lee
Infiltrado na Klan é o meu filme preferido que trabalhou o tema do racismo em 2018. Spike Lee o faz da forma mais crua e "in your face" possível.
Alguns podem achar que não funcionou pelo fato de ser muito expositivo, com diálogos explicativos demais. Mas acho que a intenção é exatamente essa aqui. Pense como uma versão (mil vezes) melhorada de The Hate U Give. A idéia não é tratar de preconceito de uma forma quase contemplativa, mais abstrata e sensível, como por exemplo o excelente Moonlight. O roteiro é bem redondo e traz personagens e motivações bastante evidentes e fáceis de digerir. Mas isso só no sentido de narrativa porque o filme é daqueles que incomoda fortemente.
O diretor consegue prolongar alguns diálogos e algumas cenas ao limite, causando uma sensação de nojo do público para com os vilões do filme. O soco na cara é muito bem dado. E talvez o que mais choca, ao mesmo tempo que diverte, seja o fato de que é uma história real. Intercalando momentos de puro desprezo e agonia nas partes de injustiça racial com um humor muito preciso (uma ou outra piadinha perde a mão e vira pastelão), o filme consegue mostrar que tem o total domínio do que está se propondo a fazer.
O humor aqui funciona de maneira didática e consegue, sem ser muito expositivo nesse aspecto, te dizer quando a piada é para rir e quando não é. Quando o opressor faz a "graça" você tem sim que se sentir constrangido e reprová-lo. Quando é o contrário não. Ele consegue te colocar no seu lugar e fazer você entender alguns conceitos de empatia que parecem ter sido perdidos pela sociedade com o passar dos anos. Isso sim é uma comédia refinada. É deliciosamente amarga a maneira como ele explicita o quão ridículo são esses supremacistas brancos e seus conceitos de eugenia.
Adam Driver é um dos melhores atores da atualidade. Ponto final. O cara só escolhe filmes ótimos e sempre nos presenteia com personagens perfeitamente manufaturados. Mas quem rouba o show é John David Washington (filho do Denzel Washington). O cara tem nuances até dizer chega. Seu personagem mostra claramente, muitas vezes apenas com o olhar, a raiva e a vontade de gritar quando passa por alguma situação racista. Perto do final ele ainda entra em uma cena em que desvirtua esse conceito e, através de expressão corporal (!), mostra uma coragem e um prazer nessa "vingança" em fazer todos os membros da KKK de idiotas, coisa que eles já eram.
Quando no final entram imagens reais e atuais que se relacionam diretamente com os acontecimentos do filme, nos anos 70, é que sentimos o chute no estômago final. A cerejinha estragada que faltava. É assustador ver que praticamente o que mudou foi o fato da discussão estar em voga e na boca de todo mundo. Porque as mudanças efetivas perdem um pouco da força quando percebemos que grupos extremistas continuam somando forças e conseguindo relativizar questões nocivas para toda a população negra. Sem contar o fato de cargos políticos do mais alto escalão serem dominados por essa galera. Triste, amedontrador e enfurecedor.
Uma obra como BlacKkKlansman é super necessário hoje em dia. Em 2018 tivemos tudo que é tipo de filme que lidam com esse assunto, todos válidos dentro de suas propostas. Mas Spike Lee fez um filme acessível para todos os públicos, especialmente as pessoas que precisam botar a mão na consciência e fazer um exercício de auto crítica e compaixão muito grande. E o diretor ainda facilita para o lado dessas turma, adicionando humor e irreverência, até mesmo dentro de uma história com passagens extremamente pesadas e revoltantes. Histórias como essa precisam chegar ao maior número de pessoas possível.
Fascinante em muitos sentidos, Infiltrado na Klan só não me consquistou ao máximo devido a algumas piadinhas e diálogos "bobos" demais e por causa da sua trilha sonora que distancia em alguns momentos, ainda que perfeitamente em harmonia com toda a vibe blackspoitation da década de 70. O design de produção, assim como a fotografia e alguns recursos de edição estilizados são 100% acurados nesse estilo. Um filmão desses, bicho.
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