Dirigido por Joel Edgerton
Boy Erased poderia ter sido muito mais impactante do que foi. Muito mais ambicioso. Mas apenas se mantém no território seguro. O bom é que esse território ainda assim funciona bem.
A direção do filme entrega boas soluções visuais em algumas cenas. Um assinatura de leve é percebida. Ainda que tímida. Quando a trilha sonora, muito boa por sinal, se junta à algumas cenas, conseguimos sentir perfeitamente o desconforto, a tristeza e o choque. Tudo no seu devido lugar. O diretor só se excede um pouco nas horas em que coloca câmera lenta para causar uma força emocional, caindo no campo da cafonice, infelizmente. As poucas cenas que realmente emocionam são quando os atores mostram suas forças com os diálogos mais inspirados e sem "fru-frus" técnicos.
O roteiro segue uma linha narrativa convencional para os dias de hoje. O fato de desconstruir a história e mostrar sempre através de flashbacks momentos chaves da vida do protagonista, funciona. Há alguns anos atrás esse recurso era chamativo e inovador, hoje é apenas mais do mesmo se feito de forma simplista. É o que acontece aqui. O problema se encontra quando ele mesmo não sabe quando exatamente colocar essas cenas, então acaba que a montagem se torna um pouco desarmoniosa. Meio bagunçado. Mas os diálogos são muito fortes e ajudam o tema, que por si só já é poderoso.
O filme também poderia ter sido um pouco mais "soco na cara" nas situações que se passam dentro do centro de conversão. A história pedia isso. É impossível não compará-lo ao filme The Miseducation Of Cameron Post (o qual eu dei nota máxima), também de 2018, sobre o mesmo assunto. São filmes "da mesma família". Mas o segundo se destaca mais, pois além de, artisticamente, ser mais autoral, consegue embrulhar o estômago de forma mais competente. Parece que as roteiristas e diretora entendiam melhor do assunto e conseguiram ter um pulso mais firme. De toda forma, essas "terapias de conversão" pertencem ao bolo do que há de mais grotesco na realidade dos EUA (e de outros lugares do mundo também) para a comunidade LGBTQI+. Ambos os filmes servem como belas denúncias. Uma ponta de esperança existe quando acabamos de assisti-los. Essas histórias estão sendo ouvidas e vistas. Isso é muito importante. É o cinema como papel social sendo produzido.
Nicole Kidman parece que cresce a cada filme lançado. Ela só amplia o alcance de suas camuflagens como artista. Sou fã de carteirinha. Russell Crowe, que eu particularmente nunca engoli, consegue até apresentar uma vontade maior em criar um personagem crível. Surpreendentemente faz um bom trabalho. E Lucas Hedges soube trazer muito bem o protagonista contido e retraído que vive toda sua adolescência seguindo o rebanho e fazendo o que mandam. Até mesmo nos momentos de explosão ele consegue mostrar que ainda assim é uma exteriorização controlada. Inclusive na maneira que imposta a voz, trêmula enquanto grita. Aos introvertidos, fica fácil de se identificar.
Boy Erased possui ideias um pouco turvas no seu conceito. Por que usaram Troye Sivan (um cantor gay), Xavier Dolan (um diretor gay) e Emily Hinkler (uma mulher, fazendo um papel de homem sem motivo aparente) como personagens com uma devida importância. Me parece uma opção para cair nas graças do público pop, deixando de lado o valor qualitativo do filme como um todo. Acredito que existam muitos ótimos jovens atores gays que fariam melhor no lugar deles. Além das apelações ao melodrama e a falta de coragem de ir mais a fundo no tema. Mas ainda assim, o filme consegue te tocar. Vale a pena a importante assistida.
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